Ministério dos Direitos Humanos destaca legado cultural e reforça urgência no combate à violência contra LGBTQIA+
No silêncio de um apartamento violado, o corpo de um homem de 59 anos foi encontrado na última segunda (22/12), em Rio Branco (AC), com múltiplas perfurações. A notícia, que poderia ser mais uma entre tantas crueldades sofridas pela comunidade LGBTQIA+ no país, transformou-se em símbolo de uma dor coletiva. Advogado, produtor cultural e servidor público, Moisés Ferreira Alencastro não era apenas um nome. Era uma voz que insistia em defender aqueles que a sociedade insiste em silenciar. E perdê-lo dói.
Na sexta (26/12), o governo Lula, por meio da Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, encaminhou uma denúncia para a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos apurar o caso. O gesto, burocrático em sua forma, carrega o peso político de reconhecer que a morte não pode ser reduzida à estatística. “As medidas cabíveis devem ser adotadas com respeito à vítima e seus familiares”, diz a nota de pesar divulgada pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC).
O comunicado lembrou da atuação de Moisés Alencastro no Ministério Público do Acre (MPAC), onde “dedicou sua vida ao acolhimento de pessoas atingidas pela violência e de seus familiares”. Além disso, também ressaltou o seu legado cultural como incalculável para o estado. Idealizador do Festival Transamazônico, o ativista colocou a população LGBTQIA+, especialmente pessoas trans, como protagonistas do audiovisual para formar plateia e fortalecer o setor na região.
A partida dele, segundo o MDHC, reforça a urgência do enfrentamento à violência, ao ódio e às discriminações que ainda tiram tantas vidas. “A memória seguirá viva em sua história de dedicação ao serviço público, na cultura e na defesa dos direitos da população LGBTQIA+.”
Movimento LGBTQIA+ questiona versão oficial
Segundo informações mais recentes, a Polícia Civil afastou a hipótese de latrocínio e também descartou a motivação de ódio. Dois jovens foram detidos, Antônio de Sousa Morais, de 22 anos, e Nataniel Oliveira de Lima, de 23, mas a prisão não encerrou a controvérsia. Para a Associação de Homossexuais do Acre (Ahac), enquadrar o caso como “crime passional” significa ignorar a dimensão estrutural do preconceito que permeia esse tipo de agressão.
Em nota, a entidade afirmou que Moisés Alencastro foi vítima de LGBTfobia. “Essas mortes quase nunca são simples. São crimes marcados pelo requinte de crueldade, pela tentativa de punição moral, pela violência que busca apagar a existência da vítima. A lógica é a mesma que sustenta o feminicídio e os crimes de ódio: a crença de que esses corpos não têm autonomia, não têm direito à liberdade, não têm direito ao amor.”
Entre a versão oficial e a denúncia da sociedade civil, permanece a urgência de nomear o ódio pelo que ele é, e de transformar luto em ação.
