Medida do Executivo regulamenta a carreira de fiscais tributários, divide sindicatos e obriga Câmara a mediar impasse
O Projeto de Lei Complementar nº 402/2025, que reorganiza a administração tributária de Rio Branco e regulamenta a função de auditor fiscal da Receita Municipal, foi retirado de pauta na última sessão ordinária da Câmara antes do recesso de fim de ano. A decisão, tomada nesta quinta (11/12) após falta de consenso e protestos, adia a discussão para 2026 e representa uma derrota para o Executivo, que havia encaminhado a proposta em regime de urgência urgentíssima.
O projeto previa a adequação da legislação municipal às exigências da Reforma Tributária, aprovada pela Emenda Constitucional nº 132 de 2023. O texto estabelecia um quadro específico com progressão automática a cada três anos, verba de atividade fixada em 10%, adicional de titulação de até 20%, além de indenização de transporte de R$ 1 mil mensais e gratificações de direção e chefia que chegam a R$ 4 mil.
“Não é sobre reajuste. É uma atualização da lei para garantir independência técnica e evitar, por exemplo, interferência política no nosso trabalho”, disse Rogério Gonçalves, presidente do Sindicato dos Auditores Fiscais de Tributos (Safirb). Ele criticou a forma como o projeto foi enviado: “Mandaram ontem para votar hoje. Aí gerou desconfiança e os colegas passaram a achar que existia algum privilégio, o que não é verdade”.
Para o Safirb, a regulamentação buscava dar autonomia técnica e instrumentos equivalentes aos demais fiscos, em linha com a nova estrutura nacional que cria o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e exige integração entre União, estados e municípios.
“A partir do ano que vem, a reforma vai funcionar de fato e o fisco municipal precisará atuar lado a lado com as administrações estadual e federal. Para isso, temos que atualizar nossa lei orgânica. O IBS [imposto substituto do ICMS] muda completamente nossa atuação, então precisamos de autonomia e instrumentos legais equivalentes aos demais fiscos”, afirmou Gonçalves.
Do outro lado, a Associação dos Servidores Municipais de Rio Branco (Assermurb), presidida por José Augusto da Silva, justificou a articulação contrária ao projeto. “Estão privilegiando apenas um grupo e deixando os demais de fora. Queremos que todos sejam incluídos. Este divórcio é injusto!”, declarou.
Os servidores das carreiras de vigilância sanitária, de urbanismo e de meio ambiente acreditam que a separação formal da estrutura tributária abre espaço para diferenciações futuras, especialmente na remuneração.
Como resultado, a insatisfação repercutiu de forma direta no Legislativo. O vereador Antônio Morais (PL), que já havia manifestado apoio ao ex-presidente do Safirb, Pedro Maia, mudou de posição e agora defende a unificação das categorias. “Hoje vejo que é uma pegadinha contra os fiscais. Defendo tabela única”, disse, em discurso lido como cena política para agradar a maioria.
O parlamentar André Kamai (PT) também criticou a condução do processo. “O problema não é só o conteúdo, mas a forma. Mandaram sete projetos em urgência, sem debate. Fomos pegos de surpresa”, afirmou. Segundo a Reforma Tributária, a redação constitucional não obriga unificação ou separação de auditores, mas reforça a autonomia de cada ente federativo para organizar seus quadros funcionais. Isso evidencia que o conflito em Rio Branco é local e político, não jurídico.
Sem traquejo político, a gestão do prefeito Tião Bocalom (PL) transferiu o custo político para a Câmara. Assim, os vereadores foram obrigados a suspender a sessão e negociar a portas fechadas com os trabalhadores, assumindo papel de mediadores de um embate que deveria ter sido resolvido pelo Executivo.
O episódio mostra como a ausência de diálogo transformou uma pauta técnica em crise institucional, expondo fragilidades e deixando o Legislativo como palco de uma disputa sindical que só voltará à agenda meses depois.
