Projeto passa com emendas mesmo após intensos protestos dos trabalhadores, que denunciam queda na renda familiar; oposição fala em “pacote do mal”
A Câmara Municipal de Rio Branco aprovou na madrugada desta sexta (12/12), em votação acelerada, o Projeto de Lei Complementar nº 41/2025, que transfere à iniciativa privada a administração, gestão e manutenção dos mercados Elias Mansour e Aziz Abucater. A proposta, enviada pelo prefeito Tião Bocalom (PL), integra um conjunto de medidas que a oposição apelidou de “pacote do mal”.
O texto foi protocolado na Casa na última terça (9/12) e pautado para votação em menos de três dias, sem tempo para debate amplo com a sociedade civil e nem mesmo entre todos os vereadores. Dos 21 parlamentares, 20 participaram da sessão; apenas João Paulo Silva (Podemos) não compareceu.
Na véspera, feirantes bloquearam a Avenida Benjamin Constant, no Centro, denunciando queda nas vendas e falta de diálogo com o Executivo. O ato paralisou o trânsito próximo ao Terminal Urbano e expôs a insatisfação de comerciantes que dependem da renda dos mercados populares.
Oposição denuncia atropelo
Durante a sessão, o presidente da Câmara, Joabe Lira (União Brasil), exaltou o “ano mais produtivo” da Casa. Mas a oposição reagiu com dureza. O vereador Neném Almeida (MDB) acusou a base governista de “enganar” os trabalhadores ao prometer retirar a proposta de pauta e aprová-la na madrugada. “Vocês assassinaram friamente mulheres e crianças”, disse, em tom inflamado, citando as famílias que dependem das decisões políticas.
Eber Machado (MDB) reforçou as críticas, classificando a gestão municipal como “fraca e mentirosa”. Ele lembrou a experiência negativa da privatização do Aquiry Shopping, que, segundo ele, resultou em queda de movimento e prejuízo para os comerciantes — experiência semelhante à do Mercado Elias Mansour. “A prefeitura comete o mesmo erro”, afirmou.
Fábio Araújo (MDB), autor da emenda que modificou o artigo 12, também se disse frustrado com a condução da pauta. “Porque as alterações que foram feitas pela base do prefeito, pelo relator do projeto, não dão garantia de direito dos permissionários que estão ali há mais de 40 anos”, declarou, convidando Bocalom a visitar pessoalmente os permissionários.
Apesar das críticas à falta de debate público e à ausência de garantias no texto original, votou favorável ao projeto após apresentar emenda substitutiva que alterou a redação de “terá prioridade” para “terá garantida” a permanência dos atuais permissionários.
Na votação da emenda, Araújo agradeceu o apoio da base e dos colegas do MDB. “Quero agradecer o consenso da Casa em entender a situação dos feirantes e das famílias que buscam sobreviver no Elias Mansour”, disse. Após a aprovação, comemorou: “Conseguimos sair com a vitória para todos vocês do mercado, garantindo que cada permissionário terá direito ao seu box”.
O que prevê o projeto aprovado:
- Concessão administrativa: empresas ou consórcios poderão disputar a gestão dos mercados em licitação pública;
- Estudos técnicos: obrigatórios para comprovar sustentabilidade e vantajosidade da concessão;
- Subsídio limitado: até 30% das despesas, reavaliado anualmente;
- Prazos: contratos entre 5 e 15 anos, prorrogáveis até 35 anos;
- Regras contratuais: metas de desempenho, locação de boxes e lojas, sanções em caso de descumprimento;
- Responsabilidade: concessionária assume encargos trabalhistas, fiscais e previdenciários, sem ônus para a prefeitura;
- Reversão: ao fim do contrato, os bens retornam ao patrimônio municipal, sem direito a indenização;
- Emenda aprovada: garante a permanência dos atuais permissionários;
- Preços: definidos por decreto, com reajuste anual pelo IGP-M ou índice equivalente.
Nota oficial e contradição
Antes da votação, após o protesto, a prefeitura divulgou nota afirmando que esteve no Elias Mansour para dialogar com os feirantes e reforçar o compromisso com a transparência. O comunicado dizia que “todas as decisões relacionadas à administração dos mercados públicos serão amplamente discutidas com os trabalhadores”.
Na prática, porém, o projeto não foi retirado da pauta e acabou aprovado a toque de caixa, sem audiência pública e sem debate aprofundado entre os vereadores. Para a oposição, esse contraste entre discurso e ação confirma o caráter autoritário do chamado “pacote do mal”.
Embate político; próximos passos
De um lado, a prefeitura defende a concessão como solução administrativa moderna, inspirada em parcerias público-privadas de outros estados, como o Mercado Municipal de São Paulo. De outro, trabalhadores e parlamentares da oposição denunciam perda de direitos, aumento de custos e falta de transparência.
Agora aprovado, o projeto segue para sanção. A regulamentação virá por decretos específicos, que devem definir valores de aluguel, indicadores de desempenho e rito de encerramento das permissões atuais.
A divisão entre Executivo e oposição reforça a percepção de que a privatização dos mercados será tema central na disputa política de 2026. Para os críticos, o PLC nº 41/2025 é mais um capítulo do “pacote do mal”, conjunto de medidas que, segundo eles, ameaça trabalhadores e enfraquece a economia popular da capital acreana.
