Edital de chamamento para o Terminal Jessé Santiago ecoa argumentos usados na polêmica entrega dos mercados municipais
A Prefeitura de Rio Branco parece ter encontrado uma fórmula. Primeiro foram os mercados municipais, entregues à iniciativa privada sob o argumento de que a gestão pública era “obsoleta e ineficiente”. Agora, o mesmo discurso reaparece, quase idêntico, no edital de chamamento público nº 01/2025, que abre caminho para a concessão da Rodoviária Internacional Jessé Santiago.
O texto oficial convoca empresas e consórcios para apresentar estudos sobre como modernizar, operar e manter o terminal. A promessa é de eficiência, segurança e investimentos sem custo imediato para os cofres públicos. Mas, assim como nos mercados, a narrativa repete-se e a prefeitura afirma que apenas o setor privado pode garantir a modernização de espaços coletivos.
A coincidência não é detalhe. É sintoma de uma política que se consolida em Rio Branco com a transferência de equipamentos públicos estratégicos para empresas, em contratos que podem durar até 35 anos. Ou seja, mais de três décadas de administração privada antes que o bem retorne ao patrimônio municipal. Uma geração inteira de usuários pode atravessar a vida adulta sem jamais conhecer a rodoviária sob gestão pública.
Nos mercados, a medida provocou protestos do Sindicato dos Camelôs e Feirantes, que denunciaram risco de exclusão e aumento de custos para pequenos comerciantes. Agora, a expectativa é de novos embates entre poder público, empresários e passageiros que dependem diariamente do terminal para se deslocar.
O edital prevê prazo de 45 dias para entrega dos estudos, que serão avaliados pelo Conselho Gestor de Parcerias Público-Privadas. Os projetos selecionados poderão ser ressarcidos em até R$ 500 mil, pagos pelo futuro concessionário. Ao fim do contrato, o terminal volta ao patrimônio municipal.
A repetição das justificativas – “ineficiência pública”, “modernização”, “desoneração dos cofres” -, mostra que não se trata apenas de decisões isoladas, mas de uma estratégia política. A prefeitura aposta em concessões como saída para a falta de recursos, mas abre um debate profundo. Até que ponto o Estado pode se ausentar da gestão de espaços que são, por definição, coletivos?
Se nos mercados a resistência foi imediata, na rodoviária o embate ainda está por vir. O que se repete, no entanto, é a narrativa oficial. A ideia de que o público falhou e que apenas o privado pode salvar. Uma história que, contada duas vezes, já não soa como coincidência, mas como projeto.
