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COP 30: Amazônia Protege associa tecnologia, dados e estratégia jurídica para enfrentar o desmatamento ilegal

Projeto do MPF já obteve mais de 700 condenações de pessoas ou empresas responsáveis por desmatamento irregular na região amazônica

Com o uso de imagens de satélite, dados públicos e atuação estratégica na Justiça, o Ministério Público Federal (MPF) vem mudando a forma de enfrentar o desmatamento ilegal na Amazônia. Desde a criação do projeto Amazônia Protege, em 2017, o MPF já apresentou mais de 3,7 mil ações na Justiça, que visam à recuperação de quase 700 mil hectares de floresta, além do pagamento de indenizações que somam R$ 10 bilhões. Desse total, a Justiça Federal já condenou, em primeira instância, 732 pessoas ou empresas responsáveis por desmatamentos na região.

O projeto foi criado como alternativa às dificuldades de fiscalização em campo. A imensidão da Amazônia e o acesso restrito por terra ou ar dificultam que os órgãos ambientais cheguem aos locais degradados. Para solucionar esse desafio, o MPF passou a utilizar imagens fornecidas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), por meio do projeto Prodes, que registra focos de desmatamento com mais de 60 hectares. Essas informações são cruzadas com dados públicos, como o Cadastro Ambiental Rural (CAR), permitindo identificar os responsáveis pelos crimes.

Com base nessas provas, o MPF apresenta na Justiça pedidos de indenização por danos materiais e morais coletivos – com valores revertidos para órgãos ambientais –, além da recuperação da vegetação nativa. Nesses processos, o órgão também pede o impedimento imediato do uso das terras e autorizações para a apreensão de bens que impedem a regeneração da floresta. O objetivo é impedir que as áreas desmatadas sejam regularizadas ou voltem a ser exploradas economicamente.

Todas as informações sobre as áreas identificadas como alvo de desmatamento ilegal estão disponíveis para consulta pública no site oficial do projeto. Na página, é possível buscar por coordenadas geográficas, CPF, CNPJ ou número da ação. A iniciativa contribui para evitar que empresas, como frigoríficos e supermercados, comprem produtos originados de áreas desmatadas ilegalmente, além de impedir a venda e compra de terras envolvidas em ações judiciais.

Coordenado pela Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural (4CCR) do MPF, o projeto conta com apoio do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Quebrando a engrenagem do desmatamento ilegal

Casos recentes confirmam a efetividade do Amazônia Protege. Em outubro de 2024, a Justiça condenou proprietários a recuperarem a floresta nos municípios de Candeias do Jamari (RO) e Apuí (AM), além de proibir imediatamente o uso da área. Em outro processo, a Justiça condenou um homem a regenerar área desmatada no Amazonas. Além da recuperação ambiental dos 125 hectares de floresta, ele deve pagar multa e indenização por danos morais coletivos de R$ 42 mil.

O uso de imagens de satélite como prova exclusiva já foi reconhecido judicialmente. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) validou a estratégia do projeto, inclusive em ações contra réu desconhecido. Esses casos se referem a situações em que não é possível identificar os responsáveis pelo desmatamento nas fases iniciais de investigações. Por isso, o MPF apresenta ações contra réu incerto ou desconhecido, a fim de garantir o impedimento imediato do uso dessas áreas.

Desde a criação do projeto, já foram desenvolvidas quatro fases do Amazônia Protege, com atuações voltadas a diferentes períodos de desmatamento. A primeira fase, divulgada em 2017, analisou a retirada de vegetação nativa ocorrida entre 2015 e 2016. A segunda analisou desmatamentos identificados entre 2016 e 2017, enquanto a terceira considerou a devastação diagnosticada no período de 2017 a 2019.

A fase mais recente, realizada no final de 2024, analisou os desmatamentos verificados entre 2020 e 2022 e resultou em 193 novas ações contra 647 réus. Os processos cobram a reparação de 147 mil hectares de floresta e indenizações no valor total de R$ 1,3 bilhão. Essa fase trouxe ainda uma novidade: além das indenizações por danos materiais e morais coletivos, o MPF pede indenização por danos climáticos, considerando a emissão de gases de efeito estufa.

O Amazônia Protege já foi reconhecido nacional e internacionalmente. Em 2024, o projeto foi o grande vencedor da 12ª edição do prêmio promovido anualmente pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), na categoria Persecução Civil e Penal. A premiação incentiva projetos que contribuem para a eficiência e a modernização da atuação do Ministério Público em todo o país.

O projeto também já foi apresentado em eventos internacionais, como o Land & Carbon Lab’s Summit, realizado em 2023, na Bélgica. No congresso internacional, o Amazônia Protege foi destaque entre os mecanismos utilizados pelo MPF para proteger o meio ambiente. O projeto também foi divulgado em fórum promovido pela União Europeia e o Instituto Igarapé.

Para fortalecer ainda mais o Amazônia Protege, o MPF implantou dez ofícios especiais vinculados à Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural (4CCR), com procuradores dedicados exclusivamente ao projeto. Entre as atribuições dos membros, está o acompanhamento de processos relacionados ao projeto e articulação de parcerias com outros órgãos públicos e a sociedade.

Além disso, para explicar para a população como funciona o projeto, o MPF lançou campanha em 2018, com o slogan “Quem desmata a Amazônia pode até tentar, mas não vai conseguir se esconder”. Os produtos de divulgação foram veiculados em rádios e plataformas digitais.

“Com inovação tecnológica e atuação firme na Justiça, o Amazônia Protege quebra a lógica econômica do desmatamento: sem lucro, o crime perde força. E ao impedir que áreas devastadas sejam legalizadas ou exploradas, o projeto se consolida como uma das principais ferramentas de preservação da Amazônia e de combate aos crimes ambientais no Brasil”, avalia o procurador da República Daniel Azeredo, coordenador da iniciativa.

Ascom MPF

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