Decisão considera que Leopoldo Fernández foi julgado de forma indevida e determina novo processo por juízo de responsabilidades
O Supremo Tribunal de Justiça (TSJ) da Bolívia decidiu anular o processo penal ordinário contra o ex-governador do departamento de Pando, Leopoldo Fernández, relacionado ao episódio conhecido como Massacre de Porvenir, ocorrido em 11 de setembro de 2008. A Corte determinou que o caso seja reiniciado sob a modalidade de juízo de responsabilidades, procedimento previsto para autoridades públicas.
A decisão foi tomada com base em um recurso de revisão apresentado pela defesa de Fernández. O TSJ entendeu que houve violação ao devido processo legal, principalmente pela ausência da figura do juiz natural, uma garantia constitucional que protege o direito de qualquer cidadão de ser julgado por um tribunal competente, imparcial e previamente estabelecido por lei.
Segundo o relator do caso, magistrado Carlos Ortega, Leopoldo exercia um cargo de autoridade pública na época dos fatos e, por isso, o julgamento realizado por via ordinária foi indevido. O entendimento se apoia na Lei 2445, que trata da responsabilidade penal de altas autoridades do Estado boliviano, ainda vigente em 2008.
Fernández havia sido condenado em 2017 a 15 anos de prisão pelo crime de homicídio culposo, sendo absolvido de acusações mais graves, como genocídio. Ele cumpriu parte da pena, ficou detido por quase 10 anos e foi libertado em 2019. A defesa afirma que a condenação causou graves prejuízos à saúde e à imagem do ex-governador e informou que irá requerer indenização por danos morais e materiais, além de ter levado o caso à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).
*_Massacre de Porvenir_*
O caso se refere aos violentos confrontos ocorridos em 2008 entre grupos de campesinos pró-governo e funcionários do governo departamental de Pando, então sob a liderança de Leopoldo Fernández. Os conflitos resultaram na morte de pelo menos 13 pessoas, em sua maioria indígenas que apoiavam o governo do então presidente Evo Morales.
Organizações de direitos humanos e a própria União de Nações Sul-Americanas (UNASUL) classificaram o episódio como uma “massacre planejado”, com indícios de que as ações teriam sido organizadas por membros do governo regional de Pando.
A anulação da sentença não representa uma absolvição definitiva. O TSJ determinou o envio dos autos ao Ministério Público para que seja iniciado um novo processo, desta vez no formato de juízo de responsabilidades, como exige a legislação boliviana para julgar ex-autoridades.
*_Próximos passos_*
O novo julgamento deverá passar por instâncias políticas e judiciais. No caso de autoridades de alto escalão, como governadores, a Constituição boliviana determina que o Congresso Nacional autorize o processamento, antes que ele avance ao Supremo.
Enquanto isso, familiares das vítimas e organizações da sociedade civil manifestaram preocupação com a decisão, temendo que a medida possa significar impunidade para um dos episódios mais violentos da história política recente da Bolívia.