William Bonner abriu o Jornal Nacional com a pergunta sobre o tema para o qual a campanha de Luiz Inácio Lula da Silva vinha se preparando: a corrupção nos governos petistas. O preparo não diminuiu o nervosismo do ex-presidente, que se agarrou a anotações escritas para citar instrumentos de combate a desvios instituídos no seu governo. O conteúdo foi discutido antes com seu advogado, Cristiano Zanin. Passados os primeiros minutos de tensão, Lula deslanchou em uma entrevista na qual fez acenos ao centro em busca de novos votos e se blindou de problemas que sabia que seriam apontados a ele.
Treinado, Lula traçou linhas divisórias no chão para barrar as críticas. A primeira, sobre a corrupção. Lula defendeu a investigação de malfeitos, mas separou-a da Lava Jato – que, segundo ele, ultrapassou o limite da justiça e descambou para a política. Ele admitiu que a corrupção ocorreu na Petrobrás e se colocou a favor de mecanismos de controle. Enfrentar o assunto em rede nacional, sem demonstrar ressentimentos, é considerado importante pela campanha para conquistar indecisos, mas o maior receio de aliados sobre a ida ao Projac era que o tema dominasse os 40 minutos da entrevista. Lula tentava puxar novos assuntos ao fim de suas respostas.
A separação mais emblemática, no entanto, veio quando o assunto foi economia. Isso porque Lula costuma lembrar dos bons números de seus mandatos e ignorar a crise econômica deixada pelo governo de sua sucessora, Dilma Rousseff. Os entrevistadores forçaram o ex-presidente a fazer a relação entre as coisas e, de maneira inédita para uma audiência como a da Globo, o petista separou-se de Dilma e disse que ela errou na economia.
O petista colocou em lados diferentes, ainda, polarização e extremismo, botando antigos adversários como PSDB ao seu lado em uma “polarização saudável” e jogando Bolsonaro para o outro. Falou com quem critica sua posição a respeito de ditaduras latino-americanas, ao dizer que no partido comunista cubano não existe polarização (e defendeu a alternância de poder). Separou o agronegócio moderno e preocupado com o país do agronegócio pró-desmatamento. Botou em uma caixa o orçamento secreto – que, segundo ele, transformou Bolsonaro em um “bobo da corte” – e em outra o mensalão, tentando minimizar o último.
A principal divisão traçada pelo petista foi, claro, entre o que ele promete e o que o povo tem hoje. Entre ele e Bolsonaro. Olhando para a câmera, Lula disse que o país precisa voltar a crescer, gerar emprego e ser feliz. Fez metáforas com futebol e, depois de um início tenso, chegou a sorrir. No aceno ao centro, usou Geraldo Alckmin como seu principal fiador, lembrou de Mário Covas e citou FHC. Se Bolsonaro foi à Globo pelo empate e comemorou o zero a zero, Lula foi em busca dos votos que ainda acha que podem levá-lo ao Planalto no primeiro turno.
Estadão