O que não foi falado sobre a ação policial no Jacarezinho

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Por Ana Carolina Cury, para o R7

A operação contra uma das maiores organizações criminosas do Brasil, Comando Vermelho, que terminou com 28 mortos, traz à tona a necessidade de falar sobre o terror instaurado pelo tráfico

Muitos já escolheram um lado na ação policial contra o tráfico de drogas que aconteceu no Jacarezinho, Rio de Janeiro, no último dia 6, deixando 28 mortos, entre eles um policial e 27 civis.

Segundo a polícia, desse número, 25 tinham antecedentes criminais e outros 2 também eram ligados ao tráfico. “Se for falar em execução neste contexto, o único executado nessa operação foi o policial civil, que tão logo desembarcou do blindado, foi alvejado na cabeça por força das próprias barricadas que o tráfico fez”, argumentou em entrevista o delegado Rodrigo Oliveira, subsecretário de Planejamento e Integração Operacional da Polícia Civil do Rio de Janeiro.

Parte da imprensa e da população está chamando a operação de “chacina”, “massacre”, outros grupos estão defendendo a conduta dos policiais contra o crime organizado.

O fato é que as circunstâncias de tal operação ainda não foram esclarecidas. Dessa forma, não é correto nem racional ter um posicionamento precipitado.

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, solicitou ao procurador-geral da República, Augusto Aras, uma investigação sobre a conduta dos agentes, após afirmar que há fatos “graves” e indícios de uma “execução arbitrária”.

É justo que se investigue o ocorrido. Porém, me pareceu que, nesse processo, Fachin deixou de lado a necessidade de analisar também a conduta dos criminosos.

Muito pouco se falou que a investigação que levou à essa operação durou mais de dez meses e descobriu que o Comando Vermelho, uma das maiores organizações criminosas do país, aliciava continuamente crianças para o tráfico de drogas. Além disso, pessoas que criavam algum tipo de inimizade com o grupo eram esquartejadas.

Segurança pública falha

Não é de hoje que a polícia do Rio de Janeiro sofre acusações de ser muito violenta em ações de combate ao tráfico de drogas.

A região vive uma crise de segurança pública grave conforme mostrou uma pesquisa sobre a expansão das organizações criminosas na capital fluminense feita pelo Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (GENI/UFF), datalab Fogo Cruzado; Núcleo de Estudos da Violência da USP; plataforma digital Pista News e o Disque-Denúncia.

Os dados revelaram que as milícias cariocas comandam 25,5% dos bairros do Rio de Janeiro, 57,5% do território da cidade. As três principais facções criminosas, Comando Vermelho, Terceiro Comando e Amigos dos Amigos, possuem juntas o domínio da maioria dos bairros.

Assim, a violência gerada pelas milícias e pelo tráfico está cada dia mais visível no cotidiano das pessoas. Mais um motivo que torna complicado tomar partido em ações como essa do Jacarezinho.

Moradores: as grandes vítimas

Já conheci algumas pessoas que têm como missão de vida tirar os jovens do mundo do tráfico. É uma luta árdua, porque os bandidos oferecem grandes quantias em troca do trabalho criminoso. Sem perspectiva, muitos entram no mundo crime.

Por isso, são os moradores dessas comunidades as maiores vítimas disso tudo. Que pai ou mãe se sente feliz ao ver o filho ser seduzido para o tráfico? Ao mesmo tempo, que familiar tem coragem de enfrentar esses líderes de facções, uma vez que isso resultará em sua morte?

É um problema muito grave. E, ao contrário do que já ouvi algumas vezes, as pessoas que residem nessas comunidades não admiram esse tipo de controle. Na verdade, elas têm medo do que possa vir a acontecer com elas e suas famílias, caso se manifestem contra o crime.

Valorização dos policiais

Não podemos ignorar esse cenário para avaliar o que aconteceu no Jacarezinho. É ingênuo achar que não há um terror imposto pelo crime organizado. É ingênuo achar que os traficantes reagem de forma bondosa ao ver policiais entrando nas comunidades. Há um poder de fogo enorme sob domínio de facções e milícias. É uma guerra urbana.

Os policiais precisam sim, de forma geral, de melhores treinamentos e também de melhores remunerações. Porque lidar com a maldade humana, diariamente, mexe com o emocional e com a vida de qualquer um.

Devemos aprender a julgar menos, principalmente quando não sabemos o que, de fato, aconteceu, e como aconteceu.

Para combater a criminalidade, é necessário e urgente parar de ignorar as proporções de violência que o crime organizado espalha. O problema é extremamente grave e a ingenuidade, nesse caso, só atrapalha ainda mais a luta contra esse mal.

 

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