Policial penal lança livro sobre prisão onde todos foram vizinhos na infância

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“Nós das Margens – Diário de um submundo” relata como as crianças nascem, morrem ou crescem nas beiras do rio Acre e viram carcereiros ou encarcerados na Colônia Penal.

Com bastante atraso, em função da pandemia e do período eleitoral, o livro “Nós das Margens – Diário de um submundo” será lançado na próxima quinta-feira, 3, na Livraria Paim, às 17 horas, com coquetel e apresentação do show “Zumzum da Mata” de Lara Pontes e grupo. O livro conta a história de seu autor, o policial penal José Janes Gomes da Silva, o Peteca, nascido no Taquari e criado nas ruas do entorno do Mercado Elias Mansour até ser alfabetizado, aos 14 anos e, mais tarde, se tornar servidor do Instituto de Administração (Iapen).

Logo de cara, no primeiro dia de serviço, Janes Peteca visualiza dentro dos xadrezes diversos condenados que foram vizinhos no Taquari e outras invasões das beiras do rio Acre e de colegas que conheceu nos tempos em que vivia como menino de rua. “Os que não foram mortos pelo esquadrão da morte, estão presos”, comenta Peteca, ele próprio um sobrevivente que passou longe do mundo do crime e das drogas.

Nascido em Cruzeiro do Sul, Janes veio com a família para Rio Branco com um ano de idade, em 1979. Viajaram de carona com um avião da FAB, seu irmão mais velho sentado sobre um motor de geladeira. Filho de um seringueiro e uma índia mestiça de puianawa com um missionário alemão, Janes recebeu o apelido de Peteca por conta dos olhos verdes, parecido com bolinhas de gude, herança do avô europeu.

Teve tudo para se tornar criminoso, como seu vizinho Isac Nascimento de Sena que tem outros quatro irmãos, com várias passagens pela Penal e presídios federais. “Não me tornei criminoso por intuição, observando as pessoas e distinguindo as boas das más, ouvindo conselhos e desenvolvendo meu próprio juízo de valor”, analisa-se Janes Peteca.

Convertido em líder de classe depois de fundar a Associação dos Agentes Penitenciários do Acre, Janes Peteca relata os momentos de extrema tensão nos presídios após 2016 com o advento da guerra entre facções, assassinatos de agentes e suicídios. Isac, seu vizinho no Taquari, concede uma longa entrevista autorizada pela então juíza da Vara de Execuções Penais e implora por ajuda para provar sua inocência do único crime que jura não ter cometido que é ser chefe ou membro de facção. E assume todos os outros pelos quais está pagando e outros que nunca foram desvendados.

No quadro de servidores do Iapen (Instituto de Administração Penitenciária) desde 2012, Janes diz que a grande lição que aprendeu neste período é aquela que todo mundo sabe de longa data: prisão foi feita apenas para pobres, pretos e putas. “Os grandes empresários que desviam dinheiro de casas populares e deixam os pobres ainda mais miseráveis são os mesmos que estupram suas filhas e não passam mais do que um dia na prisão”, comenta ele no livro.

Janes está referindo-se aos episódios que ficaram conhecidos no Acre como “Operação Delivery” e “Operação G7”, sobre uma rede de pedofilia envolvendo grandes empresários e um grupo de empreiteiros que tramavam reduzir o tamanho das casas da Cidade do Povo e passaram apenas alguns dias presos. Com 104 páginas, o livro já está disponíveis para compra nas livrarias virtuais Amazon e Estante Virtual.

Acrenews

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