Por maioria, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela inconstitucionalidade da Lei 13.269/2016, que permitia a distribuição da fosfoetanolamina, conhecida como “pílula do câncer”. A decisão foi tomada na última sexta-feira (23) e se deu no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5501, ajuizada pela Associação Médica Brasileira (AMB).
O projeto, editado em 2016 e suspenso por liminar concedida pelo Plenário do STF no mesmo ano por não ter registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), teve autoria do então deputado federal Jair Bolsonaro, à época no PP. Em 2016, Bolsonaro chegou a participar de programas de TV advogando em favor da liberação da pílula, que não tinha comprovação de eficácia.
São coautores do projeto Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), Celso Russomanno (Repúblicanos-SP) e Professora Dorinha Rezende (DEM-TO), entre outros parlamentares.
O medicamento era distribuído em São Carlos (SP) por um professor aposentado da USP, que estudava os efeitos da pílula no Instituto de Química. Por pressão de familiares de pacientes com a doença, o PL chegou a ser aprovado e sancionado pela então presidente Dilma Rousseff (PT).
Os votos dos ministros
Na semana passada, o relator do processo no Supremo, ministro Marco Aurélio Mello, votou pela inconstitucionalidade da lei alegando que compete à Anvisa permitir a distribuição de substâncias químicas, segundo protocolos cientificamente validados. De acordo com o ministro, o órgão nunca protocolou pedido de registro da fosfoetanolamina sintética.
“A esperança que a sociedade deposita nos medicamentos, sobretudo aqueles destinados ao tratamento de doenças como o câncer, não pode se distanciar da ciência”, disse o ministro em seu voto. “Foi-se o tempo da busca desenfreada pela cura sem o correspondente cuidado com a segurança e eficácia dos fármacos utilizados. O direito à saúde não será plenamente concretizado se o Estado deixar de cumprir a obrigação de assegurar a qualidade de droga mediante rigoroso crivo científico, apto a afastar desengano, charlatanismo e efeito prejudicial”.
Seguiram o relator a ministra Cármen Lúcia e os ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux. Os ministros Edson Fachin, Dias Toffoli e Gilmar Mendes votaram no sentido de restringir o uso do remédio a pacientes terminais.
“A rigor, o uso da fosfoetanolamina é permitido se não há lei que o proíba”, ponderou Fachin. “A Anvisa não detém competência privativa para autorizar a comercialização de toda e qualquer substância”.
O entendimento divergente dos ministros abre espaço para que o Congresso autorize a produção da substância dispensando o registro na Anvisa, quando não houver outras opções eficazes de medicamentos.
Sem eficácia
Essa não foi a única vez em que Bolsonaro se empenhou em difundir o uso de um medicamento sem comprovação de eficácia. Desde o início da pandemia de covid-19, ele insiste na defesa de tratamentos não avalizados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pelos principais especialistas mundiais na matéria. O caso mais notório é o da cloroquina, do qual o presidente da República se tornou garoto-propaganda. “Decidi apostar, como se fosse um jogador”, disse na cerimônia de posse do general Eduardo Pazuello como ministro da Saúde.
Jair Bolsonaro vem travando uma batalha política contra o governador de São Paulo, João Doria (PSDB-SP), sobre a compra da vacina chinesa Coronavac. Na semana passada, o presidente disse que não iria comprar o medicamento, após uma reunião entre o tucano e o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. Bolsonaro também já disse que a vacinação contra covid-19 não será obrigatória. Neste fim de semana, o presidente publicou uma foto ao lado de um cão, dizendo que a vacina só seria obrigatória no “Faísca”.
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