Estado superou, em registro de queimadas, Mato Grosso e Rondônia; em julho desmatamento também já tinha superado MT; focos de calor em 2020 estão 18% acima e governo decreta emergência ambiental
O Acre fechou o mês de agosto ocupando a terceira posição entre os estados que mais registraram focos de queimada, superando os tradicionais recordistas Mato Grosso e Rondônia em termos de impactos causados à Floresta Amazônica. No ranking do fogo do mês passado, o Acre só ficou atrás do Pará e do Amazonas, cujas áreas territoriais são até quatro vezes superior.
Segundo os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o estado registrou, entre 1 e 31 de agosto, 3.578 focos de queimada. Já Mato Grosso, que tradicionalmente ocupa as manchetes ao lado do Pará, como um dos estados que lideram as estatísticas de desmatamento e incêndios, teve detectado 3.336 focos. O vizinho Rondônia teve 3.086 focos.
Após apresentar um certo controle e até redução no registro de queimadas em 2020 – quando comparado com o ano passado – o Acre parece ter sofrido um boom de incêndios nos últimos dias de agosto. Entre 1 de janeiro e o dia 28 de agosto, por exemplo, o estado tinha uma redução de 12% na quantidade de focos detectados pelo monitoramento do Inpe quando se fazia um comparativo com o mesmo intervalo de 2019.
Já no acumulado dos oito meses deste ano – diante de igual período do ano passado – há um acréscimo de 18%: 4.044 contra 3.426. Quase 90% desta detecção de queimadas ocorreu em agosto, mês marcado na região pelo uso indiscriminado do fogo para a limpeza ou abertura de roçados e pastagens, além do emprego para limpar áreas recentemente desmatada.
Diante da aparente perda de controle das ações para conter o fogo, o governo decidiu decretar nesta terça, 1, situação de emergência ambiental. A medida também se fez necessária diante do atual nível crítico dos rios, com destaque para o Acre, responsável pelo abastecimento de água de 70% da população.
Em maio, a agência espacial dos Estados Unidos, a Nasa, divulgou estudo apontando que, entre os estados da Amazônia brasileira, o Acre pode ser um dos mais impactados por uma estiagem mais rígida. O principal motivo para isso, segundo a Nasa, é o aquecimento das águas do Oceano Atlântico, que tem como principal efeito a redução da umidade na parte mais sul da Amazônia.
Essas condições ambientais mais a elevada área de floresta que foi desmatada tornam o Acre o mais propício a sofrer com os grandes incêndios florestais, assim como em 2005. Segundo projeções da Nasa, a chance de isso se repetir é de 85%.
Em julho o Acre já tinha superado o Mato Grosso também quanto à detecção do desmatamento pela análise do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). De acordo com o monitoramento SAD, o Acre desmatou 140 km2 de floresta em julho, enquanto Mato Grosso perdeu 98 km2. Entre agosto de 2019 e julho passado o estado teve um desmatamento acumulado de 476 km2 – alta de 28% ante o período anterior.
O fogo no interior
Conforme o blog já tinha antecipado em 24 de agosto, o interior do Acre era a região do estado que mais apresentava focos de queimada, tendência que se manteve até o dia 31. Os municípios do Vale do Tarauacá/Envira, Purus e Juruá estão entre os recordistas de fogo. Dos 10 municípios que mais queimaram, apenas Rio Branco não está nestas regiões.
O topo do ranking dos incêndios é ocupado por Feijó (1.067 F), Tarauacá (684), Manoel Urbano (275) e Sena Madureira (240). Logo após aparece Cruzeiro do Sul, município do Vale do Juruá que até alguns anos atrás estava bem na traseira dos dados do fogo no Acre. No último dia 24 estava na terceira colocação.
O município registrou no mês passado 231 pontos de calor dentro de seu território; 68 a mais do que Rio Branco, conhecido por ter altas taxas de incêndios por seu entorno já ter perdido boa parte da vegetação nativa, sendo ocupada por áreas de pecuária e agricultura. Cruzeiro do Sul, por sua vez, ainda possui uma região rural com muita floresta nativa.
Abaixo da capital (no ranking do fogo) surgem três dos quatro municípios isolados: Jordão, Marechal Thaumaturgo e Porto Walter. Essa interiorização do fogo para as áreas mais bem preservadas e remotas do estado chama a atenção para dois fatores; 1) o avanço do desmatamento para uma região ainda bastante intacta da Amazônia e 2) o risco deste fogo se transformar em grandes incêndios florestais pelas atuais condições climatológicas.
Essa interiorização da destruição não fica apenas às margens de rodovias ou ramais; as margens de rios e igarapés nestes municípios também passam a concentrar grandes áreas queimadas. Com a previsão de um ano mais quente e seco no Acre, a concentração do fogo próximo a área de florestas em pé preocupa.
Após agosto já ter sido marcado por temperaturas perto da casa dos 40 graus, baixíssima precipitação pluviométrica e umidade relativa do ar na casa dos 30%, a tendência é de setembro também apresentar as mesmas condições ambientais. Com isso, um pequeno fogo feito num roçado pode adentrar na floresta em pé, cujas consequências seriam inestimáveis.
Blog do Fábio Pontes