Imagine um lugar onde é possível ouvir os sons da Amazônia, respirar o mais puro ar e sentir a energia que só a natureza é capaz de proporcionar. No rio Croa, todas essas possibilidades são reais para aqueles que se permitem vivenciar uma experiência única. Uma verdadeira conexão com o paraíso no coração da floresta acreana.
Suas águas escuras e calmas, o verde intenso da vegetação, imponentes árvores centenárias e fauna em abundância são características que fazem do Croa um local paradisíaco e que chama atenção de turistas do mundo inteiro atraídos por sua beleza fascinante. Observar o vai e vem de canoas, e acompanhar parte da rotina das 70 famílias que vivem na comunidade ribeirinha é um atrativo a parte. Uma sensação marcante, que ficará guardada para sempre na memória de quem teve o privilégio de contemplar essa maravilha natural.
Localizado em Cruzeiro do Sul, segundo maior município do estado, o Croa é de fácil acesso. Seguindo pela BR 364, no sentido Rio Branco, são apenas 22 quilômetros de distância totalmente asfaltados. Cada visitante paga, em média, R$ 15 pelo passeio nas embarcações. Os guias são os próprios moradores da comunidade ribeirinha, um novo ofício que chegou para ficar e ainda complementa a renda mensal.
Não é qualquer pessoa que tem o privilégio de trabalhar em um lugar assim. Sorte a do seu João Saraiva de Mendonça. O homem de 65 anos de idade já perdeu as contas de quantas viagens fez subindo e descendo o rio com o barco cheio de turistas. No começo, ele achou estranho aquela movimentação e o interesse de tantas pessoas em conhecer o Croa. Morador do local há 45 anos, João do Boi, como é popularmente conhecido, entendeu que o paraíso em que vive era o motivo do alvoroço.
“A gente achou estranho aquele monte de gente vindo aqui. De repente, era turista de todo lugar do Brasil e de outros países vindo conhecer esse lugar. Isso foi muito bom porque ajudou a melhorar nossos ganhos e deu emprego para muitos moradores do Croa, que vivem dessa renda do barco”, explicou.
Questionado sobre o local onde mora, o ribeirinho nascido no Seringal Valparaíso, no alto rio Juruá, é enfático:”para mim, o melhor lugar que tem para morar é aqui. Um lugar tranquilo, calmo e fácil de conseguir alimento. Vou viver aqui até o meu último dia de vida.”
Fauna e flora exuberantes do Croa
É durante o verão amazônico, período em que as chuvas ficam mais escassas na região, que um espetáculo natural invade o rio Croa, literalmente. Com o baixo nível e a correnteza fraca, uma planta aquática chamada pasta preenche longos trechos do manancial, formando uma espécie de tapete verde sobre as águas. O fenômeno é um dos atrativos do local e rendem registros fotográficos de encher os olhos.
Segundo os moradores, no auge do verão, as pastas chegam a se estender por alguns quilômetros. Para não prejudicar a navegação das embarcações, mutirões de limpeza são feitos local. A vegetação pode prejudicar o funcionamento dos motores. A retirada das pastas é feita de maneira consciente, sem danos ao meio ambiente.
Outra planta aquática que chama bastante atenção é a Vitória-Régia. O Croa é um dos poucos locais no Acre com incidência natural da Estrela das Águas, como também é conhecida. Mundialmente famosa, a planta faz parte do folclore brasileiro e do lendário indígena da Amazônia. Na fase adulta, seu tamanho pode alcançar até dois metros de diâmetro. Já a floração ocorre entre os meses de março a julho. Com várias tonalidades de cores, a flor da Vitória-Régia está entre as maiores das Américas.
Em terra firme, a selva amazônica mostra todo seu esplendor. Dona da maior biodiversidade do planeta, por aqui é possível encontrar diversos tipos de árvores nativas, como a majestosa samaúma e a histórica seringueira. O Croa é um grande produtor de chacrona. Suas folhas são utilizadas para o preparo do chá da Ayahuasca. A comunidade também é conhecida pela espiritualidade. O local possui centros religiosos do Santo Daime, doutrina criada no Acre, no início do século passado, pelo mestre Raimundo Irineu Serra.
A fauna do Croa é rica. Seus mais de três mil hectares de floresta são o lar de diversos animais selvagens. Cobras, pacas, tatus, poraquês (peixe-elétrico), arraias, gaviões, jaçanãs, entre outras espécies são encontradas com facilidade no local. A conservação da floresta e alimentos em abundância são fatores positivos para a permanência desses bichos em seu habitat natural.
Repara aqui o que o bicho tá fazendo no remanso, dona Chaguinha!
Em março de 2019, a aposentada Francisca da Silva Barros, mais conhecida como Chaguinha, vivenciou seus 15 minutos de fama. Um vídeo gravado no rio Croa viralizou na internet. Nas imagens, moradores registraram a água escura se movimentar de maneira atípica, formando uma onda e acompanhada de uma espuma branca.
Os moradores não chegaram a um consenso sobre o fenômeno. Cogitaram ser a presença de um bicho não identificado, de peixes, cobra e até mesmo um Cavalo-marinho encantado. Apesar de não ter aparecido no vídeo, o nome de dona Chaguinha foi citado pela amiga e vizinha Helena Siqueira.
Bastou apenas isso para ela virar mais um meme da rede mundial de computadores. O sucesso repentino assustou a ex-professora. “Em um dia de domingo, eu estava aqui na minha casa descansado e aí eu escutei gritar por mim: -Dona Chaguinha, repara aqui o que o bicho tá fazendo no remanso! Depois de mais ou menos uma semana, eu comecei a receber ligações. Meus filhos que moram em Rondônia entraram em contato comigo e perguntaram o que estava acontecendo comigo. Minhas amigas e outras pessoas que moram na cidade também me ligaram. Esse vídeo foi postado e eu nem sabia”, revelou.
Perguntada sobre o que realmente tinha acontecido naquele dia nas profundezas do Croa, Chaguinha não exitou. “Até a agora a gente ainda não sabe. Não vimos cobra e nenhum outro animal. Só ouvimos mesmo o barulho, vimos o rebojo, a espuma e que aquilo andava de um canto para o outro. Ainda hoje eu ainda tenho medo”, confessa.
A história de Chaguinha com o Croa começou em 1982. Naquele ano, a recém formada pedagoga foi lecionar em uma escola rural da comunidade. Por 9 anos, ela exerceu uma das mais nobres profissionais e ensinou muitas crianças a ler e escrever. Transferida para a zona urbana de Cruzeiro do Sul, ficou na cidade até se aposentar.
Vinte dois anos depois, ela decidiu retornar em definitivo. Comprou uma propriedade às margens do rio e construiu a casa onde vive com a filha e o genro, desde 2013. A mulher de 67 anos de idade tem orgulho de ser uma moradora do Croa, apesar de jamais ter tomado banho em suas águas turvas. Mas isso não tira o encanto que ela tem pelo lugar que escolheu viver até o seu último dia de vida.
“Eu sempre gostei daqui, sabe? O Croa é uma maravilha e morar aqui é uma bênção. Uma natureza bela e é muito saudável pra gente. Morei um tempo na cidade, mas eu gosto mesmo é daqui e é onde eu me sinto muito bem. Só vou sair daqui quando Deus quiser”, conta.
Os empreendedores do Croa
O casal Reginaldo Costa da Cunha e Damiana Cunha enxergou em uma deficiência a oportunidade para melhorar a renda da família. Com muitos turistas e poucos restaurantes, eles viam que muitas pessoas gostariam de permanecerem por mais tempo no local, mas a falta de estrutura acabava atrapalhando.
Foi então que Dedé, como é popularmente chamado, chamou a esposa para abrir um empreendimento no quintal da casa onde vivem. Nascia o Restaurante Sabor e Lenha. As mãos talentosas de dona Damiana e o atendimento espontâneo do marido formaram uma combinação perfeita.
“Fazemos tudo com muito amor e carinho. O tempero que uso para fazer a comida da minha família é o mesmo para os nossos clientes. Graças a Deus, temos recebido muitos elogios pela qualidade dos nossos pratos e esse reconhecimento do nosso trabalho é muito gratificante”, disse Damiana.
O local oferece vários pratos típicos da culinária regional acreana. Galinha caipira e tambaqui assado na brasa estão entre os pratos com sabor caseiro que fazem o maior sucesso entre os clientes. A demanda é tamanha que Dedé precisou deixar a função de guia turístico para se dedicar ao restaurante e, constantemente, precisa contratar mais pessoas para dar conta do movimento.
“Além dos brasileiros, já recebemos pessoas da Rússia, da China, Estados Unidos, Japão, Dinamarca, México e do Peru. Eu acho muito bom esse movimento de turistas por aqui. Foi bom para todo mundo. Ajudou os catraieiros e a gente que tem esse restaurante. Sem contar que muitos produtos que usamos são comprados aqui mesmo na comunidade”, destacou.
Por conta da pandemia do novo coronavírus, o fluxo de turistas diminuiu. Com a reclassificação para a cor Laranja (situação de alerta), em Cruzeiro do Sul, o restaurante retomou suas atividades com os devidos cuidados de distanciamento físico e de higiene. Agendamentos e informações estão disponíveis pelos telefones (68) 99966-5122 e 99924-2783.
Secom