Jornalista relata experiência com o coronavírus: “O enfermeiro que me levou pra ver Deus”

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O jornalista Pascoal Gemaque, ex-professor de Jornalismo da Universidade Federal do Acre (Ufac) e funcionário da TV União no Acre, usou as redes sociais neste domingo (3) para relatar um pouco da sua experiência com o novo coronavírus.

Gemaque testou positivo para a doença na cidade de Belém, no Pará, onde reside atualmente.

De uma forma poética, Pascoal relata siatuação em que foi levado para ver Deus por um dos enfermeiros do hospital onde está se tratando da doença. Confira o relato emocinante do jornalista:

O ENFERMEIRO QUE ME LEVOU PRA VER DEUS

Não consigo dar dez passos sem ficar esgotado fisicamente.

O vírus transformou meus pulmões em duas bolas Dente de Leite furadas pelo vizinho chato que odeia crianças.

Tarefas simples, cotidianas, equivalem a disputar uma maratona. E eu nem maratonista sou.

Precisava escovar os dentes. Pedi a um enfermeiro que me ajudasse. Aqui, onde estou internado, esses rapazes e moças têm sido incansáveis. Não apenas ajudam, mas fazem sorrindo, felizes, nos animando. Alguém um dia há de patentear esse remédio.

La vem o Cleudson (nome fictício), com uma daquelas cadeiras cujo assento lembra um vaso sanitário. Limite máximo na fronteira entre a derrota e a humilhação.

São Jorge Guerreiro, diz ele, olhando a tatuagem que trago no antebraço. É o meu também. Já foi na igreja dele lá no Rio? No Saara?

Balanço a cabeça.

-Sim, quando tinha forças pra batalha. Hoje, mal consigo brigar contra as cáries. Imagino a vergonha do santo….

-Queisso, chefe? Jorjão é irmão. Puxa pro lado, te dá dois tabefes na cara e manda pra luta.

Chegamos. Cadeira estacionada, pia, escova, “pasta”. Cleudson à porta, esperando, de costas pra mim, olhando pra cima.

Escovei os dentes como alguém resgatado de uma ilha. Tom Hanks revisitado. Chamei o Cleudson.

Após a porta, ele para a cadeira no corredor que dá para a rua.

-Chefe, olha. Já viu Deus hoje? Olha pra cima…

Quando alguém acostumado a escrever não consegue descrever algo… é porque a coisa é seria. Cores, luzes, o sol espalhado num céu único…

-Fala com Ele, chefe. Pede, agradece… aproveita aí…

Comecei a chorar…

Tô chorando até agora.

-Chora, chefe. Põe pra fora. Qual o valente que nunca chorou no campo de batalha?

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