A morte por coronavírus do jovem Yanomami é o reflexo do enfraquecimento institucional dos órgãos públicos que deveriam promover o direito à saúde e à proteção territorial dos indígenas. É desta forma que avalia o líder indígena Dinamam Tuxá, vice-presidente da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), em entrevista à Amazônia Real.
“O reflexo [desse enfraquecimento] acaba sendo as mortes. O coronavírus veio para aclarar essa realidade que ocorre no Estado brasileiro em relação aos povos indígenas”, disse Dinamam Tuxá.
Ele apontou também a recusa do governo brasileiro em “reconhecer a vulnerabilidade social dos povos indígenas e de não oferecer proteção territorial para conter o avanço do coronavírus”.
“O coronavírus age de forma sorrateira. Muitas vezes não é identificado em tempo hábil para fazer o tratamento correto no doente. As estruturas do Estado não estão preparadas para lidar com a especificidade dos povos indígenas. Estamos temerosos, porque sabemos que a estrutura estatal vem sendo enfraquecida e um vírus como esse, ao adentrar numa área indígena, vai causar um genocídio em massa”, alertou.
O líder destacou que este “processo genocida” dos povos indígenas vem ocorrendo há muito tempo no país e se agravou no atual governo, levando o Estado brasileiro a não conseguir agir “de forma hábil para tentar amenizar o impacto do coronavírus no povos indígenas.”
“Estamos preocupados, porque a Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena) vem em um processo de enfraquecimento e não está tendo apoio para que desenvolva trabalhos essenciais no combater ao vírus nas terras indígenas. Assim como o jovem Yanomami veio a óbito, tememos que haja uma explosão de óbitos em outros indígenas”, afirma.
Dinamam Tuxá diz que outro temor é quanto a uma possível tentativa dos órgãos governamentais em omitir os dados sobre infecção do coronavírus nos povos indígenas para “negar o avanço [da covid-19] nas terras indígenas” no intuito de esconder “mais um novo genocídio que se iniciou anos atrás e concretizado no governo atual”.
Ele também relatou dificuldades do movimento indígena em participar dos debates sobre a pandemia da covid-19 no gabinete de crise do governo federal e a apontou a indiferença dos governos estaduais às medidas solicitadas e protocoladas pela APIB. Apenas dois governos responderam confirmando o recebimento aos ofícios enviados pela Apib – de São Paulo e do Rio Grande do Norte -, mas sem nenhuma sinalização efetiva se vão atender as recomendações.
“Não há plano de contingenciamento. O gabinete de crise do governo estava recusando a entrada dos povos indígena nessa discussão. Hoje está sendo cumprida essa medida de entrada no gabinete, através do Fórum de presidentes do Condisi (Conselho Distrital de Saúde Indígena), por causa da recomendação do MPF. Tudo que nós pleiteamos está sendo feito através de medidas no âmbito no judiciário. Não há um acordo entre os povos indígenas e o governo para traçar estratégias para tentar amenizar esses impactos”, afirmou ele.
Ele também criticou a postura das autoridades estaduais e municipais de apresentarem um “bloqueio histórico à presença indígena” e de negar apoio logístico às aldeias. “Dizem que é tudo competência da Sesai. Mas os poderes são harmônicos. Se a Sesai não está tendo subsídios suficientes para garantir aquisição de materiais, de insumos, EPIs (Equipamentos de Proteção Individual), etc, o município tem sim dever, assim como o governo estadual, de suprir essa ausência do governo federal”.
Sem uma atuação conjunta entre os diferentes entes federativos, diz Tuxá, o resultado será a “a mortandade de nossos povos”.
“Estamos atentos para acionar para quem for de direito, para impetrar as devidas ações, para conseguir e combater esse vírus que veio para dizimar nossas comunidades. Estamos politicamente e espiritualmente preparados para conseguir avançar e combater de forma apropriada, buscando órgãos de controle para garantir a integridade física, cultural, territorial dos povos indígenas”, afirmou o líder indígena.
Amazônia Real